Ao estabelecer uma conexão entre mente e corpo, uma das premissas da Técnica Alexander, o aluno entra contato com um novo nível de autoconfiança na performance musical, além de adquirir competência e potência emocional para tocar ou cantar.
A metodologia de estudo colocada aqui consiste em seis táticas que descobri como percussionista erudita. Na música clássica, o nível de perfeccionismo exigido é tão alto que facilmente faz a nossa alma congelar! Tentando cuidar do meu corpo durante o estudo para a minha tendinite crônica não voltar, eu descobri que as táticas que estava aplicando para não machucar os meus músculos estavam proporcionando um nível de tranquilidade emocional e autoconfiança nova no meu tocar, melhorando minha performance musical. Aqui vão as táticas que me ajudaram neste processo de construção de autoconfiança na performance musical:
Tática 1 – ‘Estudo inteligente vs repetição’
É uma situação muito comum entre músicos, chegar numa parte difícil e senão conseguir o resultado desejado na primeira vez, ficar repetindo este trecho até ficar melhor. Preste atenção no que está realmente acontecendo neste instante. Repetindo o trecho na esperança de que vai melhorar, estou ensinando o meu sistema nervoso fazer associações em relação a este trecho do tipo: “preciso repetir este trecho, então este trecho é difícil”, “ele está chegando e eu fico com medo que não vai sair na primeira”, “estou com medo e isso significa que estou tensa”, “estou com medo e isso significa que não quero estar lá naquele instante, quero me esconder”, entre muuuuuitas outras associações meio inconscientes…
Aqui, o propósito deve ser: “Quero ensinar o meu sistema a estar disposto e feliz a estar lá para tocar ou cantar o trecho, então quero evitar a repetição ‘com esperança’ no estudo e criar estratégias para um estudo inteligente”.
As próximas cinco táticas são estratégias para um estudo inteligente visando melhora na autoconfiança na performance musical.
Tática 2 – ‘Distribuição do trabalho’
Na grande maioria dos instrumentos, a única parte do nosso corpo que toca o instrumento são os nossos dedos (sim, os dedos, não a mão! Mais sobre isso no texto “Estrutura da mão e do pulso”). Se eu preciso tocar mais rápido ou mais forte, a agilidade ou a maior força muscular é para ser feita pelos dedos e não por outras partes do corpo. A tendência de tensionar a mandíbula, o pescoço, os ombros ou as pernas quando precisamos de mais esforço é bem familiar para a maioria de nós. Construindo um estudo que revela o meu potencial técnico, não existe energia para gastar em tensões desnecessárias. Assim, “quero continuar me lembrando que nem o meu tronco nem a minha cabeça vão tocar o instrumento, mas sim os meu dedos”.
(Para instrumentos como a voz, onde o esforço é em outras partes do corpo, ou a bateria, onde precisa esforço nos pés, o principio de distribuição de trabalho – força – é para ser aplicado nessas partes.)
Tática 3 – ‘Desconstruindo e desmistificando a dificuldade técnica’
Quando a velocidade da peça é mais rápida do que eu consigo tocar, o jeito mais comum de estudar é começar em uma velocidade mais lenta e tentar aumentar a velocidade cada vez mais. Achei uma alternativa mais eficaz, que me permitiu desmistificar o conceito da dificuldade técnica: colocando o metrônomo no andamento desejado, em vez de tentar tocar a frase musical inteira (que às vezes é impossível no começo), começo só com a última nota.
Com muita precisão, e sem ficar repetindo muitas vezes, começo a praticar estar em uma condição de tranquilidade executando uma nota só. Com presença e precisão, como se essa nota única fosse a peça inteira. Quando percebo que consigo executar a nota com tranquilidade e precisão, adiciono a penúltima nota e continuo estudando no mesmo jeito. Quando novamente percebo que consigo tocar as duas últimas, começo executar as três últimas notas e continuo adicionando notas, até chegar ao começo da frase do trecho.
Este método de desconstruir o trecho cria uma condição de segurança e presença em toda nota. Estou ensinando ao meu sistema nervoso como ficar relaxado e focado ao mesmo tempo. É o tipo de qualidade de autoconfiança e eficiência que admiramos quando Elis Regina canta ou quando Louis Armstrong toca trompete, quando Martha Argerich toca piano etc.
Tática 4 – ‘Começar do fim’
Nós sabemos muito bem acompanhar a partitura ou uma peça do começo ao fim. O sistema nervoso vai ficar mais cansado do meio até o fim da peça, a tensão vai ser acumulada indo para o final. Por isso, bem no começo do estudo de uma nova peça, começo do fim para o começo, escolhendo trabalhar primeiro nos trechos difíceis do final. Assim, cria-se a condição para que, em uma performance musical, o final seja a parte mais conhecida e tranquila.
Tática 5 – ‘Intervalos: parte obrigatória do estudo’
O músico está produzindo música porque adora música. Na hora do estudo ficamos encantados com tocar, obsessivos em lidar com as dificuldades técnicas e querendo conseguir cada vez mais! Mesmo com o melhor uso corporal, mesmo com a musculatura relaxada e alerta, o cérebro se cansa. Então, mesmo que eu tenha meia hora para estudar, considero importante fazer um intervalo para checar se eu estou fazendo um estudo inteligente ou um estudo repetitivo. No estudo repetitivo podemos deixar o cérebro no “piloto automático”, mas o estudo inteligente tem como pré-requisito um cérebro acordado e, por isso, precisa de intervalos. Lembre-se de fazer pausas, sua performance musical agradecerá!
Tática 6 – ‘Criar as condições da apresentação’
No momento da apresentação, nosso sistema nervoso está mais excitado do que quanto estamos estudando. Assim, estudar em uma condição “normal” para o sistema nervoso não vai nos ajudar na hora da apresentação e nem em nossa melhora da performance musical. Por isso, ao estudar a peça inteira é importante criar as condições que façam o nosso sistema estar mais nervoso. O uso de gravador, vídeo ou até um público de amigos é uma ótima oportunidade de praticar o “estar em condições de tensão maior”. Se as notas e os ritmos estiverem bem resolvidos, não adianta ficar repetindo a peça em condições tranquilas.
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Essas táticas de estudo fazem parte do conteúdo do módulo ‘Fortalecendo Competência e Autoconfiança na Performance Musical’ do curso Consciência Corporal Para Músicos (CCPM).